segunda-feira, 12 de setembro de 2016

Tudo começa a tomar forma


Por Jânsen Leiros Jr.

I – História das origens do universo e da humanidade (1:1 – 11:32)
A.   A criação do universo e da vida (1:1 – 2:3)

Capítulo 1

Segundo dia: A divisão das águas

6 E disse Deus: Haja firmamento[1]  no meio das águas e separação entre águas e águas. 7 Fez, pois, Deus o firmamento e separação entre as águas debaixo do firmamento e as águas sobre o firmamento. E assim se fez. 8 E chamou Deus ao firmamento Céus. Houve tarde e manhã, o segundo dia.

Terceiro dia: A terra seca, o mar e a vegetação

 9  Disse também Deus: Ajuntem-se[2]  as águas debaixo dos céus num só lugar, e apareça a porção seca. E assim se fez. 10 À porção seca chamou Deus Terra e ao ajuntamento das águas, Mares. E viu Deus que isso era bom. 11 E disse: Produza a terra relva, ervas que dêem semente e árvores frutíferas que dêem fruto segundo a sua espécie, cuja semente esteja nele, sobre a terra[3]. E assim se fez. 12 A terra, pois, produziu relva, ervas que davam semente segundo a sua espécie e árvores que davam fruto, cuja semente estava nele, conforme a sua espécie. E viu Deus que isso era bom. 13 Houve tarde e manhã, o terceiro dia.
  
[1] (1:6) firmamento, hebr. ráqîa’

Expansão, vastidão, lâminas largas batidas, espelho fundido ou ainda extensão.

A Terra passa a ser o foco da narrativa. Deus começa a preparar o ambiente para a existência da vida. O caos inicial começa a dar lugar a um cenário organizado e adequado ao desenvolvimento da flora e fauna, além do surgimento, mais tarde, do ser humano.

A expressão hebraica traduzida por firmamento, traz a idéia de uma estrutura sólida que se estendida pelo teto do céu visível, separando o mar (águas inferiores) das águas superiores (Sl. 148:4), que a seu tempo eram derramadas sobre a terra pela abertura de suas comportas (Gn. 7:11; 8:2). No livro de Jó 37:18, o firmamento chega a ser considerado como sólido, como algo se interpondo entre as duas massas de água.

O importante nessa passagem, contudo, é que ela estabelece seqüência lógica entre os fatos narrados no processo da criação, ligando intimamente este fato ao passo seguinte que será o surgimento da terra seca e o mar. Os dois feitos de Deus, inclusive, parecem se completar mutuamente, pois só após o surgimento da terra seca, Deus expressa sua satisfação com mais essa obra e diz que era bom.

[2] (1:9) Ajuntem-se

Temos aqui uma visão excepcional do cuidado do Criador com sua obra. Ainda providenciando o cenário onde a vida se desenvolveria, Ele ordena que as águas deixem visíveis a terra seca (Sl. 104:5-9). Isso dá a entender que a já se encontrava formada por Ele quando esta veio à tona das águas inferiores, mas para atender aos propósitos de Deus aguardava sua ordem.

A palavra hebraica aqui usada é qavah que dá sentido de alinhamento, transmite a idéia de um “assentamento”  das águas abaixo do firmamento, que as colocasse em um mesmo nível, de modo que seus termos ficassem estabelecidos (Jó 38:8-11; Pv. 8:27-29).

[3] (1:9) Relva, ervas, árvores que dêem fruto

O Criador continua seu empenho em fazer da terra um habitat adequado e agradável ao homem, tornando-a capaz de produzir aquilo que lhe é próprio.

Há uma demonstração de abrangência quando o narrador cita essas três formas de vida vegetal, não se prendendo a diversificar na narrativa todos os seus gêneros e espécies. Mesmo porque, a expressão hebraica aqui traduzida por relva é deshe’, que no contexto bem pode ser entendida como “toda a vegetação”, diferençando apenas o que é árvore frutífera.

É interessante pararmos um pouco aqui nesse ponto. Alguns rabis defendem a idéia de que a intenção inicial de Deus era criar árvore-fruto (uma árvore que fosse fruto toda ela e frutificasse o ano inteiro), e que nesta passagem se encontra a primeira desobediência na terra a uma ordem  de Deus. Segundo eles, essa rebeldia da terra em não produzir aquilo que Iavé ordena, corrobora a esperança de um novo céu e uma nova terra, que, essa sim, obedeça à voz do Criador. Uma idéia sem sustentação, pois numa análise bastante simples temos:

a) A criação atendeu plenamente ao propósito divino “... e viu Deus que era bom”, que por sua vez não pode ser frustrado em seu intento. A corrupção do estado original de perfeição da terra somente se deu após a queda do homem. O anseio por novos céus e nova terra é decorrente do estado de maldição no qual se lançou, pelo pecado, tanto a humanidade, quanto a natureza.

b) A frutificação demanda “amadurecimento” daquele que gera fruto. O próprio fruto se encarrega de semear a terra com seus iguais, que amadurecendo a seu tempo, gerarão ainda mais frutos, num processo aqui inaugurado de auto-sustentabilidade, sob a mão poderosa de Deus.

c) O fato de cada árvore possuir seu tempo certo para frutificar de forma alternada, “segundo suas espécies”, talvez fizesse parte de algum programa divino de alimentação dos animais e do homem, uma vez que essa foi a orientação recebida por Adão (1:29-30). 

A frutificação a seu tempo implica num ciclo onde a árvore se renova e se revigora. Ela precisa passar pelo “outono” , quando as folhas velhas caem, para logo mais voltar a florescer e novamente frutificar. Não é esse o milagre operado por Deus no coração do homem que se renova para frutificar?